quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

A relação entre a arte e o Inconsciente - Um Paralelo entre Jung e Camille Claudel


Por Carlos Bruno Alves Ribeiro

Este artigo tem como objetivo o estudo da relação entre a arte e o inconsciente, usando como fio condutor das discussões a arte como expressão do inconsciente, ou seja, a influência dos fatores externos nas obras artísticas. Para isso, o presente artigo usa como objeto de estudo A Onda ou “La Vague” de Camille Claudel, uma obra que exibe três banhistas, prestes a serem engolidas por uma onda gigantesca. A obra, pertence à nova fase de seu trabalho, destacando o uso da figura feminina. A unidade da peça vem justamente da disposição das figuras femininas e do movimento da onda em diferentes suportes, expressam o embate do humano com as forças da natureza, um esboço do inconsciente, um misto de sentimentos, como, inveja, ciúme, carência e resistência.

Uma obra diz muito sobre o artista, isso, partindo do pressuposto que a obra de arte é a impressão do inconsciente, assim, a arte e a ciência necessitam de uma inversão, de novos conceitos, idéias e novos caminhos de percepção. Ambas dependem da mesma sensibilidade emocional e física, ritmos, consistência, novidade, metáfora e analogia, ou seja, a conjunção entre a mente e as mãos. Um abreviado da vida de Camille Claudel expressa claramente essa relação. Ela viveu com intensidade, adiante de sua época, em um momento em que para mulheres era vetado o ingresso na Academia de Belas Artes. Auguste Rodin foi mestre, amante e modelo de diversos desenhos e esculturas de Camille. Nesse contexto, ela se tornou cada vez mais possessiva, fatores como o desejo incontido de Camille, a repulsa de Rodin, a fratura psicológica da mulher no período, resultaram em seu internamento num instituto psiquiátrico pelo próprio irmão e pela mãe, cansados de seus escândalos.

Devastação e o conceito de angústia, tal como a Psicanálise os concebe, criam um retrato de uma artista esmagada pela sociedade em seu tempo, expressão impressa em sua arte, à custa de um imenso sacrifício. Assim, para compreender melhor essa analogia, este artigo usa da linha de análise de Jung para interpretar sua obra. Jung se ocupou sobretudo da análise dos sonhos, investigando as imagens psíquicas. "Analisou fantasias e delírios do doente mental e ocupou-se com o estudo comparativo entre as religiões e a mitologia.
Sua linha de análise, parte do estudo do "arquétipo”, palavra que deriva do grego e significa "a cunhagem original". Na psicologia, os arquétipos representam padrões da natureza humana.  “Arquétipo nada mais é que uma expressão, já existente na Antiguidade, sinônima de idéia, no conceito platônico”. Ou seja, o arquétipo permanece oculto, mas pode ser percebido, através dos "motivos arquetípicos" e apenas estes são acessíveis à consciência. As imagens e idéias arquetípicas são desenvolvidas a cada vida e se manifestam condicionadas pelo tempo e espaço. Os arquétipos não são figuras ou símbolos com forma definida, mas são idéias universais que revelam imagens estruturantes do psiquismo.

Transferindo esta analogia para a obra de Camille, que é a impressão do seu “oculto”, o arquétipo da obra, “A onda”, pode criar um paralelo com o seu inconsciente, através do uso de figuras femininas, prestes a serem devoradas por uma onda, figuras estas que permanece de pé, como resistência de algo maior e opressor, representado por uma onda. Podendo ser observado no movimento vibrante das suas esculturas toda a dramaticidade da composição, por vezes até agressiva. Para Jung, "Se você não estudou os temas míticos, nunca poderá entender a pintura de seus doentes". Os arquétipos míticos, para Jung, são de cunho universal, envolvem a realidade do homem, por onde fluem as imagens do mundo esquizofrênico quando o ego se esfacela. Levando em conta a vida pessoal de Camille, sua obra foi influenciada principalmente no que diz respeito às perdas afetivas que a levaram a desenvolver a doença mental. Através do simbolismo presente em sua obra, a artista projetava seu estado de espírito materializado em sua própria escultura, expondo através das relações humanas, seus desejos, medos, anseios, preconceitos paixões, frustrações, decepções. Para Jung, os sonhos são como indicadores de uma necessidade de transformação, sinais que mostram capacidades latentes a serem despertadas.
Uma onda no mar será sempre uma onda e quando observamos o mar podemos sempre saber identificar quando uma onda aparece, porém, ninguém pode identificar como essa onda vai se manifestar, a forma exata da onda ou perceber uma onda igual a outra. Ou seja, a onda é sempre a mesma, mas ela se manifesta de formas diferentes dentro das condições em que seja possível sua expressão. Assim, os arquétipos são modelos que trazem idéias originárias da mente, para Jung, os sonhos são manifestações do nosso inconsciente, que podem revelar aspectos de nossa vida cotidiana, informações sobre nós que falam sobre afetos, crenças, emoções que não queremos admitir para nós mesmos, por isso se tornam inconscientes. O sonho nos revela esses conteúdos de uma forma simbólica. A representação da água presente no mar, na maioria das vezes, trata de questões emocionais. O mar pode ser uma representação do inconsciente e o movimento, limpeza e estado da água metaforizar nossos sentimentos e emoções. O usa da representação simbólica da onda gigante na obra, pode sugerir um período de grande turbulência emocional, em que as águas do inconsciente parecem estar prestes a nos engolir. Conseguir flutuar sobre elas, ou não ser atingido, pode ser um bom sinal. Muitas vezes é difícil de esquecer um sonho com o mar. Lindo ou terrível, pacífico ou tenebroso, colorido ou cinzento ele alaga os nossos sonhos e fala mais sobre nossos segredos do que podemos imaginar. O médico psicanalista Giovanni Gangemi fala sobre o que a presença do mar nos sonhos pode significar e da importância de olharmos, sem medo, para sua verdadeira força que, no espelho da sua água, reflete a nós mesmos.
                                                                                    Ribeiro, Carlos Bruno Alves

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